22/11/2007

Tudo começou com a senhora Lima

Tudo começou com a sra. B. Souza e Lima. De uma vida de conflitos e dificuldades financeiras, ao sossego e a garantia de uma poupança de (6) seis mil contos de réis.
Ao atravessar a rua do Ouvidor indo em direção ao metrô, com a mente pesada por tantos e variados problemas, a sra. B. Souza e Lima tropeçou misteriosamente num panfleto que a chamava pelo nome, e, fascinantemente, dizia: “sra. B. Souza e Lima, chega de miséria, venha para a nossa corrente de 726 sacerdotes e se livre dessa uruca e desses encostos”. Com os olhos ajoelhados naquelas palavras, a sra. BSL foi limpa e passou a se vestir de tailler creme combinando com sapatos de couro de jacaré da Saara. Foi sorteada no consórcio de corsas usados e se mudou para Del Castilho, deixando Mesquita, que ela não gostava.
O sr. Fábio Almôndega Filho vivia uma vida de conflitos e dificuldades. Peregrinava pelos hospitais públicos suplicando uma operação em sua mulher Luzia A. F. Numa tarde de terça-feira, ao lavar seu rosto num fétido banheiro de hospital universitário viu, pelas gotículas que espirraram no espelho: “Venha corrente 726”. Ao receber, logo depois, de uma esfuziante senhora, um jornal que explicava timtim por timtim a tal corrente, percebeu que lá estava completo o chamamento. Depois que da corrente participou, Almôndega operou a mulher numa clínica de Botafogo, tomou chá gelado com limão em Ipanema e sorriu sem vergonha pela primeira vez para o mar.
Silvana Silva da Penha vinha há muito vivendo uma vida de conflitos e dificuldades. Com o nome no Serasa e SPC por causa de um dvd que comprou num impulso, não conseguia mais dormir. Um dia, à noite, ligou a tv com seu permanente cigarro nos dedos e viu, em todos os canais, o chamamento para a corrente dos 726 sacerdotes. Chorou muito, e, ao ver um filme meloso em seu dvd, apareceu a mensagem no trailer, como é que pode? Punha a mão no aparelho no transe elétrico que a tomava. Misteriosamente, o sistema do Serasa entrou em pane e Silvana teve subitamente seu nome limpo. Ainda conseguiu aumento em seu emprego, sendo promovida para auxiliar de serviços gerais II. Hoje tem uma bela coleção de dvds, alguns piratas, é verdade, e um namorado novo para acompanhá-la nas sessões caseiras.
Gislete Coelho da Mata queria muito sair daquela vida de conflitos e dificuldades. Seu marido não cumpria mais com as obrigações maritais e ela pressentia que era pelo fato de seus seios terem murchado na amamentação de seu último filho, temporão. Também contribuiu para esse quadro triste a tuberculose hospitalar que pegara, quando da retirada de verrugas. Certo dia, na Cinelândia, quando chegara até mesmo a pensar em alugar algum rapaz por uma mísera hora de prazer, uma senhora robusta leu seus pensamentos e lhe disse: “saia dessa vida de conflitos e dificuldades, venha para a corrente dos 726 sacerdotes da Igreja Se Deus É Por Nós...” Subitamente Gislete sentiu algo saindo dela, um troço escorrer como se um expurgo, e aceitou na hora participar da corrente, doando os 30 contos que ia jogar no prazer fácil. Acontece que dos 700 que esperava da correção do Plano Collor ( que nos trouxe, a todos nós, muitos conflitos e dificuldades ) algo como mágica maior transformou os 700 em 7000, um zero aumentado fez com que Gislete colocasse o tão sonhado silicone: o marido despertou de novo em desejos e até o jornaleiro, sempre visto com cuidado, hoje participa de sua vida.
O transformista Paloma Bittencourt Doirado preparava-se para o suicídio havia 2 anos. Com uma vida de sacrifícios e dificuldades, não suportava mais aqueles 17 cm pendurados entre suas pernas e seu andar suave. Fora o horrível saco escrotal que a oprimia quando desejava sentar como queria. Tentara de tudo, mas a verdadeira solução seria operar. Acontece que a operação ficaria em 25000 e ele só juntara 5 em 2 anos de árduo trabalho na Glória. Paloma estrava encostada na Ponte Rio-Niterói, sabendo-se filmada, quando da indecisão do vão central lhe veio a intuição, ou uma voz, ela não sabia bem, porque ventava muito: “porque não se dar uma última chance, buscando a corrente dos 726 sacerdotes?” Foi o que ela fez. Uma semana depois, ao jogar por acaso na surpresinha da mega-sena, foi uma das que levou o prêmio de 32000, dado aos ganhadores da quina. Paloma pode cortar o que lhe incomodava e ainda angariou o filho de um dos 726 sacerdotes. Vive feliz, sem filhos, mas sem conflitos nem dificuldades, em Vila Isabel.
O Pai de Santo Zéfiro Chester vivia uma vida de conflitos e dificuldades. Fizera tudo o que era mandinga da forte para melhorar de vida, mas percebia que o velho ditado do santo de casa não faz milagres realizava-se nele. Irritado com aquela seqüência inútil de ebós, oferendas e preguieiras, tirara férias em Mangaratiba. Lá, tomando banho nas águas azuis e oleosas sentiu algo esbarrando em seu corpo enrijecido. Pensando ser uma alga, percebeu aos poucos que tratava-se de um panfleto quase desfeito pela água. Levou-o para a areia e o remontou. A seqüência de letras formou seu nome, o que o intrigou bastante. Viu um telefone que se mantinha no papel macerado. Ligou. Ali mesmo, de Mangaratiba uma voz veio em seu socorro: aceitamos também o senhor. Saia dessa vida de conflitos e dificuldades. Ele se mudou para Mangaratiba, com o FGTS comprou um belo salão de beleza e ainda abandonou a família podendo finalmente assumir seu amor secreto, seu ex-ogan.
Marieta Consorte sempre levou uma vida de conflitos e dificuldades. Um dia teve um sonho, estava entrando na Igreja Se Deus É Por Nós... No outro dia, alegando que ia doar sangue, fugiu do trabalho na mercearia quebrada que sempre lhe atrasava o pagamento e partiu para a Igreja. Lá, na hora h em que entrava, reconheceu Mariano, seu amor adolescente, becado. Ele lhe disse: apenas sabia que você viria, mas não o dia. Estamos precisando de alguém para arrecadar os donativos. Ela ficou bem na fita, só vendo.