29/11/2009

A caixa de cinismos

Não sei se é o fim de ano que se aproxima rápido, não sei se são as quadraturas de planetas ( não entendo muito, mas deve ter Saturno no meio, nada de Júpiter ), ou se algum vírus novo que se aloja na mente. O que sinto, muito, é que as relações estão estranhas. As relações, tensas, passaram a ser ditadas por um mero compromisso formal. Algo de um telemarketing estilizado. Na pressa, tentam vender o vazio das ofertas, sem muita credibilidade.
As relações políticas azedaram de vez cansando as imagens nada originais de mãos políticas capturando grana pública, políticos que vão e vem como as ondas do brejo ( e ao que parece sempre haverá uma mãozinha sendo esticada para receber o dinheiro surrupiado, filmada por uma câmera escondida ) ou com insinuações pesadas retiradas lá da cela do fim da ditadura, que apenas serviram para intoxicar mais ainda o ar. E que servem apenas para tentar dinamitar a personagem, mas estranho guardar a péssima anedota por tanto tempo, na esperança (talvez? ) de que o sindicalista assumisse ares de fidalgo inglês? Ou a revelação assim, subitamente posta, solta na presunção de estilhaço, não estaria no patamar do cinismo da galhofa?
Um banquete feito por aquelas panelas alienígenas que são vendidas por apresentadoras inábeis de shoptime, que fazem as gororobas práticas para dispensar visitas, farofa de micro-ondas, .
As relações profissionais, também cansadas, buscam apenas confirmar a rotina do ganha pão ou panetone obrigatório ( que começou lá na punição a Prometeu ).
Parece que o cinismo tornou-se a capa dos discursos. Nos espaços destinados a mostrar o que surge de novo há a velha artimanha dos agrupamentos das tribos eleitas por simpatias, nos contatos profissionais o cinismo retoma a velha forma da preservação: não venha se formar aqui. Nos supostos espaços sofisticados do pensamento e escritura, o cinismo está encapado por um elo perverso e tenso – que faz muita gente débil, esperta e com poder tentar impedir a aproximação de quem tenha mais talento – o que revelaria, por força, a debilidade dos titulares.
Pode-se abrir a caixa de Pandora hoje, ela está vazia. Já temos derramado no cotidiano os áridos movimentos da vulgaridade, a pequenez do gesto humano sobrepujando-se aos gestos nobres, os fétidos odores do cinismo. Resta apenas a esperança, seca, no fundo.
Uma desconfiança do outro – algo contínuo. Que se o outro existe, isso passa a ser um problema. Encapado pelo cinismo, o discurso tenta justificar o conteúdo da caixa: que se há fome no mundo, alimentemos o mundo. Que se há guerra e perseguição no mundo, rezemos. Que se o exagerado uso das maquinarias e detritos detonou a natureza, reciclemos, replantemos com eucaliptos as matas originais, e sobrará papel para contar todas as histórias. Que se houve um momento radicalizado do pior do homem, que dizimou milhões, a culpa está datada e localizada. Que se você não pensa assim, modernize-se ou caia fora.
Apodera-se, como uma gosma, o cinismo do discurso. Não há mais espaço para auto-crítica, mea culpa e até mesmo harakiris, que honra o quê!
Há apenas um movimento sedento para seguir, como se a caixa de Pandora aberta há muito não já tivesse lançado também seus precipícios.

Um comentário:

  1. Anônimo9/1/10

    Como pode isso? Textos que nos retratam tão bem sem nenhum comentário. O será que é vc que não aprova nenhum?

    ResponderExcluir

Meu blog de gaveta.