14/07/2010

Maria-fumaça não canta mais para moças, flores, janelas e quintais

Se algum processo de privatização deu certo nesse país – leia-se telefonia – com certeza não supriu o desastre da liquidação da Rede Ferroviária Federal SA em 92.
O país, que já apostava tudo no transporte rodoviário na década de 50 ( no delírio desenvolvimentista de Kubitschek ) lançou sobre o povo esse peso do deslocamento rodoviário, uma vez que o transporte marítimo/fluvial também é absurdamente ignorado.
O trem então virou objeto de transporte meramente turístico, o que causa espanto em qualquer analista de transporte diante do nosso imenso território nacional.
O transporte aéreo, por mais que venha um dia a se tornar viável, está longe de substituir a importância do trem, que interliga pequenas cidades a cidades médias e metrópoles. Nem precisa se utilizar o exemplo do poderio do sistema do transporte ferroviário na Europa para se justificar a sua importância para o Brasil.
Tivesse qualquer governo, desde Itamar Franco, refeito a malha ferroviária teríamos um outro país. Bilhões, trilhões, quatrilhões de reais já foram gastos em manutenção de rodovias e construção de aeroportos – enquanto as estações apodrecem em todo interior do país. Nem servem como paradas para o transporte ferroviário de carga.
Nenhum governo conseguiu perceber que o sistema de transporte ferroviário é vital para qualquer país, e quinquilhões e sestilhões de reais foram investidos para a criação de uma crise: cidades entupidas de carros, estradas inter-estaduais perigosas e esburacadas e limitação geral do deslocamento para a maior parcela da população brasileira.
Francamente: agora o governo Lula abre licitação para um trem bala a custo de 33 bilhões de irreais. Bem, a empresa aérea irlandesa Ryanair quer lançar a passagem em pé a 4 libras ( 10 reais ) para vôos de curta duração. Ou seja: em breve, se a idéia for aplicada por aqui, poderemos nos deslocar entre Rio e São Paulo por 10 contos em 45 minutos. O trem bala terá a passagem a 200 reais, e a viagem terá a duração de uma hora meia.
Eu realmente não sei para que servem os governos – se nem para governar com um mínimo de estratégia e planejamento são capazes. Utilizam nossa grana para propaganda, cargos, projeções e, quando não, desvios gerais. Um candidato real, se tivesse alguma plataforma que prestasse, certamente incluiria a retomada do transporte ferroviário a um custo modesto para a população. Enviei para Marina Silva, que me parece ser a candidata que está um pouco mais afastada dessa dialética barata do fiz mais do que vocês, para ver se ela se toca.
Com certeza teríamos milhões de empregos diretos e indiretos nessa empreitada..
Mas quem deseja a volta da Maria Fumaça estilizada? Queremos o futuro, o trem bala a 300 por hora e 200 por cabeça. Quem vai querer um trem modesto cruzando as montanhas? Um governo de verdade iria querer, sem dúvida.
Isso me parece com nosso sistema de votação: tudo muito sofisticado e moderno, o país conhece em pouco tempo seus eleitos e nada de contar cédulas sobre as mesas, que deu na vitória suspeita de Bush. Mas o problema é que nesse sistema super moderno de votação ainda se leva o número do coroné na lapela.
Trouxemos o futuro ( eu juro que acredito que meu voto lá na máquina ágil é registrado certinho, apesar de não ter sequer uma confirmação disso ) mas as personagens ficaram aprisionadas em um passado que nunca é fechado.
Passamos para o trem bala, não, sem antes, sucatear toda a malha ferroviária tradicional, e isolar o país dramaticamente.